O STF decidiu na RCL 67652 que os juízos de 1ª e 2ª instância podem impor uma etapa prévia à reintegração de posse em casos de esbulho ocorridos após a pandemia de Covid-19.
Drª Debora de Castro da Rocha |
Os ministros consideraram que, devido ao poder geral de cautela do magistrado, é possível admitir um sistema de transição similar ao estabelecido durante o período pandêmico.
Em dezembro de
2022, um terreno onde a Ambev possui uma fábrica, foi parcialmente esbulhado.
Em 1ª instância, foi indeferida a liminar para que os invasores desocupassem o
local. Os moradores da comunidade contestaram, afirmando que a Ambev nunca teve
posse do imóvel e que ali residem pessoas vulneráveis, como estrangeiros,
mulheres e crianças.
A empresa
recorreu da decisão. A desembargadora do TJ/AM, ao analisar o agravo,
determinou que o juízo de 1º grau aplicasse o entendimento do STF na ADPF 828,
observando o regime de transição e adotando medidas para a desocupação do
terreno.
Nesta ação, o STF
determinou um regime de transição a ser adotado após a proibição de desocupações
durante a pandemia de Covid-19. O Supremo entendeu que Tribunais de Justiça e
TRFs deveriam instalar comissões de conflitos fundiários para apoiar os juízes
e elaborar estratégias para retomar decisões de reintegração de posse
suspensas. Além disso, as comissões deveriam realizar inspeções judiciais e
audiências de mediação, com participação do MP e da Defensoria Pública, antes
de decidir sobre a desocupação, mesmo em locais com determinações de despejo.
Aplicando a
decisão monocrática do TJ/AM, o juízo de 1º grau determinou que oficiais de
justiça buscassem nomes de interessados para uma audiência de conciliação,
dando seguimento ao processo. A Ambev, então, apresentou reclamação ao STF.
O Ministro
Relator considerou a demanda parcialmente procedente, pois houve a aplicação
equivocada do paradigma do STF, lembrando que a Corte entendeu que haveria um
regime de transição, mas que seria aplicável durante a pandemia, o que não é o
caso dos autos. Além disso, afirmou que a jurisprudência do STF limita a
aplicação desse regime às ocupações ocorridas até o final da pandemia ou até
31/3/21, conforme a lei 14.216/21. No entanto, o ministro destacou que o caso
concreto tem peculiaridades que justificam uma abordagem diferente.
Na contestação,
os moradores afirmam que a área do litígio é ocupada há vários anos por
famílias e que, a partir de 2016, foi expandida, e a Ambev não se manifestou
como prejudicada, sendo que o único muro existente na área é o de uma igreja.
Por outro lado, o juízo de 1ª instância fundamentou a decisão em posse
nova, afirmando que a data do esbulho ocorrera em dezembro de 2022.
Com base na
divergência quanto à data da ocupação, o Relator considerou que não há
informação segura de quando ela efetivamente ocorreu. Ademais, ressaltou que a
desembargadora proferiu decisão levando em consideração complexidades, como a
população vulnerável de indígenas e estrangeiros.
Por isso, apesar
de o caso não guardar aderência estrita às hipóteses da ADPF 828, nada obstaria
que as instâncias ordinárias determinem etapas prévias de conciliação, mediação
ou que exijam participação de órgãos públicos antes da reintegração de
posse. Ainda, afirmou que o CNJ editou a resolução 510/23 com algumas
orientações nessa direção. Ou seja, para o Conselho, mesmo em reintegrações de
posse nova, é facultada a realização de audiência de conciliação e mediação.
debora@dcradvocacia.com.br
Foto: Cla Ribeiro.
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